Tópicos do Artigo:
- A Base Científica da Sequência dos Tubos
- Desvendando a Sequência Universal: Um Passo a Passo Estratégico
- O Primeiro da Fila: Hemoculturas e Tubos para Sorologia
- O Ponto de Atenção: Tubos com Anticoagulante Citrato
- Entre o Azul e o Lilás: Os Demais Tubos
- O Fechamento com EDTA: Hematologia e Imuno-hematologia
- Erros de Coleta e Seu Impacto nos Resultados
- A Integração entre Coleta e Laboratório: Um Ciclo de Qualidade
Vamos conversar sobre um daqueles procedimentos que, à primeira vista, parece pura burocracia técnica, mas que na prática clínica é um dos pilares da confiabilidade diagnóstica: a ordem dos tubos para coleta de sangue.
Se você é técnico de enfermagem, biomédico, farmacêutico ou estudante da área da saúde, sabe que essa sequência aparentemente rígida tem motivos profundos e científicos. Ignorá-la não é apenas “seguir um protocolo chato”; é arriscar resultados alterados, diagnósticos equivocados e, em última instância, o bem-estar do paciente. Neste artigo, vamos além da simples listagem de cores. Vamos desvendar o “porquê” de cada passo, oferecer dicas para situações complexas e reforçar como a escolha correta do anticoagulante e da ordem dos tubos são indissociáveis para o sucesso da análise.
A Base Científica da Sequência dos Tubos
A primeira grande falácia a ser derrubada é a de que a ordem é arbitrária ou baseada apenas em conveniência. Cada tubo, identificado por sua tampa colorida, contém aditivos específicos projetados para preservar a integridade da amostra para um determinado grupo de testes. O grande vilão da contaminação cruzada é o anticoagulante EDTA (presente nos tubos de tampa lilás ou rosa), seguido de perto pelo citrato de sódio (tampa azul) e pela gel separadora (tampa amarela ou vermelha com gel). Se coletarmos primeiro um tubo com EDTA e, com a mesma agulha, puxarmos o tubo para coagulação, vestígios do anticoagulante podem inativar a cascata de coagulação no segundo tubo, tornando inviável a realização de um coagulograma, por exemplo. Portanto, a ordem é, antes de tudo, uma estratégia de controle de qualidade que começa no ponto de cuidado.

Desvendando a Sequência Universal: Um Passo a Passo Estratégico
A sequência mais amplamente aceita e recomendada por organizações como a CLSI (Clinical and Laboratory Standards Institute) prioriza a coleta dos tubos que devem permanecer estéreis ou livres de qualquer contaminante, seguidos daqueles com aditivos. Vamos dissecar cada um, com suas nuances e razões.
O Primeiro da Fila: Hemoculturas e Tubos para Sorologia
Se o paciente necessita de hemoculturas, estas são sempre a prioridade absoluta. A razão é óbvia: precisamos capturar os microrganismos circulantes sem nenhuma contaminação por aditivos químicos de outros tubos. Em seguida, vem o tubo de tampa vermelha (sem aditivos) ou o tubo com gel separador (tampa vermelha/amarela). Este é o tubo para bioquímica sérica, sorologias e marcadores sorológicos. Coletá-lo primeiro, após as hemoculturas, garante um soro puro, essencial para dosagens hormonais precisas e detecção de anticorpos.

Fundamentos em Hematologia – Hoffbrand & Moss – 7° Edição – Editora Artmed

Tratado de Hematologia – Vanderson Rocha – 2° edição – Editora Atheneu
O Ponto de Atenção: Tubos com Anticoagulante Citrato
Aqui chegamos a um dos pontos mais críticos. O tubo de tampa azul clara, contendo citrato de sódio a 3,2%, é utilizado para os testes de coagulação (TAP/TTPA, entre outros). A proporção entre o sangue e o anticoagulante neste tubo é rigorosamente calibrada (9:1). Se o tubo não for preenchido completamente, o excesso de citrato interfere drasticamente nos resultados, podendo falsamente prolongar os tempos de coagulação. Por isso, quando se utiliza o sistema a vácuo, é fundamental que o tubo azul preencha até a marca de vácuo. A coleta manual com seringa exige ainda mais cuidado na transferência. A correta ordem dos tubos coloca o azul logo após o tubo seco, antes de outros tubos com aditivos mais “agressivos”, como o EDTA.
Entre o Azul e o Lilás: Os Demais Tubos
Após o tubo de citrato, a sequência pode variar ligeiramente conforme o protocolo local, mas uma lógica comum é inserir os tubos com outros anticoagulantes. O tubo de tampa verde (heparina de lítio ou sódio) vem a seguir. A heparina ativa a antitrombina III, inibindo a trombina. É excelente para bioquímica plasmática de urgência (como lactato e amônia), pois não causa diluição significativa da amostra. Depois, pode vir o tubo de tampa cinza, com fluoreto de sódio e oxalato de potássio. O fluoreto é um inibidor enzimático que bloqueia a glicólise, preservando a glicose por mais tempo – crucial para dosagens de glicemia mesmo com atraso no processamento.

O Fechamento com EDTA: Hematologia e Imuno-hematologia
Por fim, coletamos os tubos com EDTA (tampa lilás, rosa ou, para genética, branca). O EDTA quelante de cálcio é o padrão-ouro para a hematologia completa, pois preserva perfeitamente a morfologia celular. No entanto, é um contaminante terrível para a maioria dos outros testes. Deixá-lo por último na ordem dos tubos protege as amostras anteriores. O tubo rosa, também com EDTA, é frequentemente utilizado para bancos de sangue, por ser de plástico e mais seguro no manuseio. É vital inverter suavemente esses tubos após a coleta, garantindo a homogeneização do anticoagulante, com o sangue e evitando coágulos que inviabilizam a análise no analisador hematológico.
Erros de Coleta e Seu Impacto nos Resultados
Um pequeno deslize na coleta pode gerar um enorme efeito dominó no laboratório. Vejamos os mais frequentes:
- Inversão da Ordem: Coletar o tubo com EDTA antes do tubo azul (citrato) é o erro clássico. Resultado: coagulograma inviável e necessidade de recolha, causando estresse ao paciente e atraso no diagnóstico.
- Homogeneização Inadequada: Não inverter suavemente os tubos (de 5 a 8 vezes) leva à formação de microcoágulos, especialmente nos de EDTA e citrato. No analisador hematológico, isso pode causar obstruções e resultados falsamente baixos de plaquetas.
- Garrotear por mais de 1 minuto: Estamos falando sobre a ordem dos tubos, mas não vamos esquecer que garrotear por mais de 60 segundos pode causar hemólise e, o laboratório pode não conseguir realizar o exame.
A Integração entre Coleta e Laboratório: Um Ciclo de Qualidade
A responsabilidade pela qualidade da amostra não termina quando o tubo é rotulado. O laboratório clínico deve fornecer feedback contínuo aos coletores. Fotografias de amostras hemolisadas, lipêmicas ou coaguladas, com explicações sobre a provável causa (muitas vezes técnica de coleta), são instrumentos educativos valiosos. A ordem dos tubos é apenas um elo, ainda que vital, de uma corrente que inclui transporte adequado, tempo de centrifugação e estabilidade da amostra. Quando coleta e análise se comunicam, os níveis de recolha caem drasticamente e a confiança nos laudos dispara.
Referências Bibliográficas
- HOFFBRAND, A. V.; MOSS, H. Fundamentos em Hematologia de Hoffbrand. [s.l.] Artmed Editora, 2018.
- tubos laboratoriais – Enfermagem Florence. Disponível em: <https://enfermagemflorence.com.br/tubos-laboratoriais/2-10/>. Acesso em: 9 dez. 2025.
- Tipos de coleta de sangue: materiais, passo a passo e técnicas. Disponível em: <https://blog.mobimed.com.br/coleta-de-sangue/>.

